Ato político
Sirvo-me uma vez mais da sensatez de Henrique
Fontana, um líder político honrado, qualificado e acima de qualquer suspeita.
A estranha justiça de Hélio Bicudo e Miguel Reale Júnior,
por Henrique Fontana
Esta semana, o ex-promotor Hélio Bicudo
e o jurista Miguel Reale Júnior entregaram na Câmara dos Deputados mais um
pedido de impeachment da presidenta Dilma Rousseff. Já é o terceiro remendo ao
original, diga-se. Nele pedem o impedimento de uma presidenta sob a qual não
pesa nenhuma acusação de crime cometido, ou mesmo denúncia de corrupção. O
remendo atual, aos insustentáveis pedidos anteriores, esta apoiado na suposta
reincidência do governo na prática das pedaladas ficais no ano de 2015. Vejam:
de um ano fiscal que sequer terminou, sobre contas do governo que ainda não
foram analisadas por técnicos e ministros do Tribunal de Contas da União, e
muito menos votadas pelo Congresso Nacional, a quem cabe a última palavra. O
ex-promotor e o jurista inauguram assim uma nova modalidade no Direito
brasileiro: a “presunção de crime futuro”, que mais parece uma versão nacional,
torta, do famoso filme “Minority Report”.
Nesta estranha justiça, apresentaram
seu pedido de interrupção do mandato presidencial ao presidente da Câmara,
Eduardo Cunha. Justamente sobre o qual recaem diversas denúncias de corrupção e
robustas provas da existência de contas no exterior abastecidas com dinheiro
provindo de propinas e corrupção que remontam a década de 1990, conforme
denúncia do Ministério Público Federal acolhida pelo Supremo Tribunal Federal.
Mas sobre isto silenciam.
Parece ainda que não merece nenhuma
linha de indignação por parte de Bicudo e Reale as denúncias de mau uso da
máquina pública por Aécio Neves e seus mais de cem voos diretos Minas-Rio, o
Trensalão do PSDB paulista, o Mensalão tucano de Minas Gerais, a operação
Zelotes, ou as contas secretas no HSBC na Suíça.
Movidos pela intolerância política, ou
cegos pelo ódio crescente expresso por certas camadas da sociedade e parte da
grande mídia, a quem pretendem representar, o certo é que esta miopia ética
embaça a visão do todo e foca apenas na parte. A que lhes interessa, fique
claro. A indignação seletiva esconde uma reação, quase alérgica, a tudo que
represente esquerda, movimentos sociais, distribuição de renda, políticas
públicas de inclusão social.
Instrumentaliza-se convenientemente o
tema da corrupção, que deve ser combatida diuturnamente, para apear do poder a
presidenta da República e tornar proscrito apenas um partido, criminalizando
seus militantes e simpatizantes indistintamente.
Na perspectiva de Bicudo e Reale, o
respeito ao devido processo legal, à democracia e a legitimidade conquistada
nas urnas não representam nenhum impeditivo aos seus ímpetos, e a ilegitimidade
do atual presidente da Câmara acusado de corrupção como condutor da insensata
marcha do impeachment é apenas um detalhe. Na ânsia de retirar do poder a
presidenta Dilma, o ex-promotor e o jurista promovem uma estranha noção de
justiça – enviesada – que se levada a termo produziria na verdade uma vingança
política para a parte litigante conservadora inconformada com o resultado das
urnas de 2014.
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