Ato político
“Ato político” invoca novamente a lucidez sempre terna,
pertinente e relevante de Marcos Rolim.
Embarcar na onda de Rolim é algo leve, seguro, profundo e
prazeroso. Vale a pena navegar pelos escritos, ditos e feitos desse cara!
Política e irrelevância, por Marcos Rolim
Consciência política, como todos sabem, é matéria em falta no Brasil.
Faz tempo, é verdade. Falar mal da política e dos políticos tornou-se um
esporte nacional e a ênfase nas críticas tende a ser maior quanto mais o
crítico esquecer suas próprias responsabilidades. A começar, por exemplo, dos
votos que já deu. No Brasil, alguns meses após as eleições, grande parte das
pessoas _ pobres e ricos, analfabetos e pós-graduados _ não lembra em quem
votou. Diante deste fenômeno, é preciso perguntar: por que a política tornou-se
irrelevante para tanta gente no Brasil?
A primeira resposta rápida é aquela que reduz o problema a um processo
de sucessivas desilusões. As pessoas teriam se tornado distantes da política,
em síntese, porque suas expectativas foram frustradas. O ceticismo dominante
seria, então, o "troco" aos políticos e aos partidos, a resposta da
impotência e do ressentimento, em que deboche e insulto se confundem. O que há
de errado nesta resposta é a separação metafísica entre representados e representantes.
Um processo de desilusão com a política é sempre, por definição, uma
autocrítica. Quem vota em bobalhões se tapa de bobagens; quem vota em bandidos
legitima seus crimes; quem seleciona incompetentes terá o nada que demanda.
Errar, é claro, faz parte desse processo e, por isso, em todas as democracias
desenvolvidas, eleições servem para afastar maus políticos; momento em que a
cidadania realiza um balanço e ajusta contas com quem esteve abaixo das suas
expectativas. No Brasil, o processo eleitoral funciona melhor para manter os
piores, porque as regras vigentes _ do financiamento das campanhas até a
distribuição do fundo partidário, do tempo de TV e do voto personalizado _
punem as condutas morais e recompensam a falta de escrúpulos. De novo, temos
aqui uma interação entre um sistema perverso e a falta de consciência política
da maioria.
A segunda resposta rápida é
lembrar a educação como solução para a falta de consciência política. Dito
assim, sem precisar conteúdos pedagógicos, trata-se de generalidade simplificadora.
A alienação política é uma ausência, um vazio, que convive perfeitamente com
diplomas universitários. O tema, então, é mais complexo e remete para a postura
diante do mundo que permite à cidadania o protagonismo na esfera pública. Dito
de uma forma mais simples: a consciência política é o resultado a que chegamos
quando percebemos o quanto é possível influenciar uma decisão pública com base
em argumentos e nos dedicamos a esta possibilidade. O que há de perturbador na
alienação política é que ela naturaliza o fato de as pessoas viverem
mergulhadas na esfera privada das suas existências, tratando tão somente dos
seus problemas, perseguindo apenas seus próprios objetivos. Uma maldição que,
frequentemente, se confunde com a hostilidade diante de tudo aquilo que, por
ser público, não cabe no império das causas miúdas. Uma vida dedicada à esfera
privada seria, para os antigos, uma vida sem qualquer sentido. Para os
modernos, transformou-se na senha para a felicidade. Por isso, a política é
cada vez mais marginal no Brasil. Não porque tenha se tornado menos importante,
mas porque o espaço que ela inaugura exige cidadãos, não consumidores.
Marcos Rolim é Jornalista
Artigo publicado originalmente no jornal Zero Hora do dia 23 de setembro
de 2012.
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