Que os bons ventos de Herval invadam o país inteiro!
Aqui mesmo em nossa cidade,
escuto algumas opiniões que dizem que o principal problema do Brasil seria a
Constituição Federal de 1988, por ela ter estabelecido muitos direitos e nenhum
dever aos cidadãos. Que, em termos econômicos, essa gama de direitos foi um equívoco,
na medida em que seu custo jamais caberia no orçamento do governo,
especialmente, a partir dos governos petistas em nível nacional e que isso
seria o responsável pelo dito colapso atual nas contas públicas, sendo a solução
única e inadiável cortar esse mal pela raiz para darmos a volta por cima e fazer
o Brasil progredir de fato (com menos ou nenhum direito, na base do cada um por si).
Primeiramente, é preciso
dizer que esse discurso representa e traduz a visão ideológica ultraliberal,
pela qual o Estado ou a máquina pública são um espaço ou estrutura podre e
improdutiva por si mesmo. Que o poder público até precisa existir, porém seu
tamanho deve ser mínimo e seu papel precisa ser “neutro” ou “nulo” diante do
cenário econômico e social, deixando o território e os lucros livres para a iniciativa
privada que, segundo esse pensamento, é a única honesta e competente, vez que
os governos só saberiam atrapalhar ou “surrupiar” recursos que acabariam sendo
canalizados para a corrupção ou usados para sustentar “vagabundos” (políticos,
servidores públicos e pessoas que já nasceram na faixa populacional considerada
de baixa renda). Isto é, por essa lógica o bom governante seria aquele que conquista o governo com a missão de delegar o poder absoluto ao "deus mercado".
Em segundo lugar, é preciso
dizer que nem todos os direitos assegurados pela Constituição Federal geram
custos para o governo. Ou seja, além dos direitos sociais da cidadania que
devem ser assegurados e geram custos ao governo, a Carta Magna de 1988
estabelece uma série de direitos fundamentais, como os direitos civis, humanos
e políticos, que não necessariamente produzem despesa financeira e se trata
apenas de colocar o país no pacto e nos passos das nações civilizadas do
planeta. Ou seja, quando o governo equipa as polícias ele precisa arcar com uma
despesa, mas a forma de orientar a ação policial em nada depende de dinheiro e pode representar a diferença entre a vida e a morte de pobres, pretos e prostitutas
(e cada vez mais mulheres em geral), para usar um jargão que identifica as
vítimas desde sempre preferidas e, ao mesmo tempo, apontadas como culpadas pela
violência no país.
Digo isso porque, mesmo sem
muita gente perceber, todas as disputas presidências pós-ditadura militar ou reabertura
democrática, sempre tiveram esse debate sobre o tamanho,
o papel do Estado e os direitos sociais da população como pano de fundo. A
novidade na atual corrida presidencial é que uma das candidaturas (mesmo que
muitos também não percebam), no aspecto econômico, além de acusar os
pobres como o problema ou mal irremediável do país, também defende abertamente como problema
o fato das mulheres, negros, índios e homossexuais (as chamadas minorias) terem
alcançado há 30 anos o direito constitucional de viverem livre e plenamente suas escolhas ou condição humana, sem serem considerados inferiores ou fora dos “padrões”, pois
todos são iguais perante à lei.
Por tudo isso, entendo que
vivemos um momento muito nebuloso e perigoso que pode nos levar de volta ao
período pré-Getúlio Vargas, aprofundando e acelerando o processo iniciado por
Temer de retirada de direitos, de desmonte da máquina pública e de
desmantelamento da indústria nacional, tendo como resultado uma elevação ainda maior do custo de vida, o aumento da
legião de cerca de 15 milhões de brasileiros hoje desempregados e a produção de uma multidão de indigentes, de norte a sul do Brasil. E, pior, junto com isso, impondo a todos
nós uma verdadeira ditadura em termos de costumes e comportamento, efetivada
senão pela violência física, mas pelo avanço e institucionalização da tortura psicológica
e da pregação desvairada que usa em vão o nome de Deus, da pátria e da família,
a qual já cobriu como uma sombra o céu do antes colorido e multifacetário Brasil.
Mas apesar dos pesares,
mantenho a fé no Brasil e no povo brasileiro. Acredito que as pessoas realmente
de bem irão perceber o abismo ao qual estamos sendo arrastados. Que elas irão
perceber que escolher um presidente não é escolher nenhum salvador da pátria
nem alguém que terá o poder de interferir em questões de foro íntimo ou da
esfera particular (esse é o papel da família). Pelo contrário, é justamente
isso que está em jogo nessa eleição. Precisamos de um presidente decente, trabalhador,
da paz e competente que cuide bem daquilo que é função de um presidente, que é fazer a ponte para a soma do melhor de cada um sem nenhum tipo de distinções e abrir as portas das oportunidades para todos e todas.
Então, que
a voz das urnas em Herval no primeiro turno sirvam de luz no fim do túnel e soprem pelo país inteiro os ventos do Brasil que prefere convergir que dividir, amar que odiar, reencontrar o bom
caminho do que repetir erros de um passado distante que virou uma velha roupa
que não nos serve mais nem nunca serviu!
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