Ato político
O
golpe não é só no Brasil. Quem está atento aos fatos e conhece minimamente a
história, a geopolítica mundial e os projetos políticos em disputa, sabe que o
golpe é uma forma de fazer a América Latina recuar nos avanços alcançados na
última década, em termos econômicos, políticos e sociais.
No
passado, o intento de manter nosso continente sub o jugo dos colonizadores ou
exploradores das nossas riquezas e soberania, foi alcançado por meio da
ditadura das armas. Hoje, tal propósito se consuma por outras formas de
ditadura, caracterizando um regime de exceção que não é percebido por muitos pelo fato de ser encoberto num manto de legalidade e empunhar cinicamente a bandeira da
moralidade - a moral dos imorais, vale dizer -, sustentada pela destruição da imagem e da propaganda sistemática que qualifica seus opositores como corruptos, o que configura uma verdadeira versão moderna da caça às bruxas (ou aos líderes que podem virar esse jogo).
Os regimes de exceção são o
tipo de sistema político que corresponde aos governos de restauração
neoliberal. Na Argentina, no Brasil, no Equador, se revelam como o modelo político
compatível com governos que reagem contra os governos populares,
antineoliberais.
São sistemas
políticos baseados na judicialização da política, como forma de criminalizar os
líderes populares, assim como os movimentos sociais e as formas alternativas de
meios de comunicação. Uma aliança entre os meios de comunicação monopolistas,
os partidos de direita, setores do Judiciário e da polícia, são o bloco político
que implementa os regimes de exceção, instrumentos da restauração do
neoliberalismo
Um traço típico
desses regimes de exceção é a perseguição aos líderes populares, pelo que
representam de defesa dos programas antineoliberais, de extensão dos direitos
sociais e políticos a todos, de soberania nacional, de crescimento econômico e
der extensão do mercado interno de consumo de massas.
Típicos da
conjuntura política atual são as tentativas de excluir a possibilidade de que
os lideres mais populares que esses países tiveram neste século, possam voltar
a se candidatar a ser presidentes de novo. O que aconteceu agora no Equador é
mais uma expressão de que regimes que aderem a projetos antipopulares e
antidemocráticos, tem com obsessão excluir a possibilidade de se enfrentarem a
candidaturas exatamente as políticas que eles tratam de desfazer.
O que confirma que
o governo de Moreno traiu o mandato que ele recebeu nas urnas e' que nada do
que ele faz – inclusive o referendo – estava no seu programa. Ele coloca a responsabilidade
da situação econômica do país nos supostos gastos excessivos do governo de
Rafael Correa, da mesma forma que diz a direita equatoriana. E como fazem as
direitas da Argentina e do Brasil.
Para defender esse
tipo deposição, Moreno não pode se enfrentar a Correa, que representa o oposto
do que Moreno diz e faz. Então ele tem como objetivo central a exclusão de
Correa como possível candidato que proponha a retomada do programa que teve
mais sucesso na historia do Equador.
Assim como a
direita boliviana se dedica prioritariamente em tentar impedir que Evo Morales
possa ser de novo candidato a presidente. Sabem que não podem enfrentá-lo em
campanha democrática, por isso gostariam de excluí-lo da campanha. Ao mesmo
tempo que desenvolve a campanha midiática – na mídia tradicional e na internet
– mais suja que a Bolívia conheceu, similar à que fez na campanha do referendo,
com a absurda invenção de uma suposta amante e de um filho clandestino de Evo.
A direita boliviana
trata de rebelar a setores de classe media que se sentem incomodados pela
afirmação dos direitos da massa indígena do povo, por isso desenvolvem
campanhas racistas, de discriminação, com mentiras e falsas acusações. Sabem
que é a única maneira de conquistar apoios para disputar com Evo Morales,
responsável pelo governo que transformou a Bolívia da maneira mais
extraordinária.
Da mesma forma na
Argentina se busca criminalizar a Cristina Kirchner, para tentar excluí-la, via
judicialização da política, da possibilidade de que ela volte a disputar a
presidência do país e volte a exercer plenamente sua liderança popular, sem as
absurdas acusações com que tentam manchar seu prestigio e seu apoio popular.
Conforme o governo Macri vai perdendo apoio, como resultado sobretudo dos
efeitos socialmente nefastos da sua política econômica neoliberal, amplamente
favorável ao capital financeiro, ele precisa intensificar os ataques a
Cristina, para tentar impedir que se imponha a comparação entre o governo
antineoliberal dela e o governo neoliberal do Macri.
Enquanto aqui o
Lula é vitima da mais monstruosa campanha de perseguição política, paralela ao
apoio expresso em todas as pesquisas, fazendo com que ele seja o único líder
brasileiro em condições de pacificar o país, retomando um projeto que fez a
economia crescer com distribuição de renda, como nunca antes o Brasil tinha
conhecido. Se sucedem os processos contra o Lula, ao mesmo tempo em que
explodem os escândalos contra os próprios juízes que o acusam, de utilizar
auxílios-moradia como forma vergonhosa de superar o teto dos salários que podem
receber legalmente.
Por Emir Sader
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