Ato político
“O grande problema do
Brasil é o serviço e os servidores públicos”, já diziam os badaladores do “estado
mínimo” na década de 1990. Para eles quanto menos estado, mais eficiência e
justiça para todos. O estranho é que após a enxurrada de privatizações
promovida por FHC e seus seguidores, como Britto no RS, o resultado foi
exatamente o oposto. O mesmo se verificou em todos os países do mundo que
seguiram essa receita, a exemplo da Argentina. Os próprios Norte Americanos
defendem o estado mínimo apenas para os outros, já que eles criaram inúmeras
estruturas e mecanismos visando que o público pudesse contrapor ou até mesmo
frear o excesso de interesse privado nas relações e negócios.
Na prática, o estado mínimo
aumenta o fosso que separa ricos de pobres, além de ferir de morte a estrutura
estatal restante, uma vez que não raro os privatistas entregam para meia dúzia
de investidores uma mina de lucros (vide o caso da Vale) enquanto o conjunto da
sociedade herda as dívidas e ainda precisa conviver com a falta dos recursos ou
do papel estratégico desempenhado por essas empresas dentro do mercado, como
ocorreu com a venda de parte da CEEE.
Ou seja, quem compra as
empresas estatais fica com o filé mignon e o estado (e consequentemente a
sociedade toda), arca com os prejuízos e ainda leva a fama de que a estrutura
pública não funciona e só serve para garantir privilégios.
Nem o estado máximo de
países como Cuba nem o estado mínimo dos neoliberais, que deixa um rastro de
miséria, deturpação da democracia, desmonte de políticas e das instituições
públicas, exploração humana, destruição ambiental e outras maldades mais por
onde passam. Defendo o estado necessário ou do tamanho exato para garantir crescimento
econômico combinado com justiça social, numa parceria produtiva, não predatória
e fundada em bases democráticas entre o setor público e a iniciativa privada.
Não é exatamente o que
discute, mas é nesse contexto que se insere o escrito de Juremir Machado da
Silva que ora compartilho.
Governos sem
projeto caçam funcionários públicos
Houve tempo, não muito distante, mítico ou real, embora cada vez menos
lembrado, em que candidatos apresentavam programas aos seus eleitores durante
campanhas animadas e governantes executavam projetos aprovados nas urnas. Era
simples, prático e com algumas decepções. Acabou. Olho a cena nacional, em
nível municipal, estadual e nacional, e o que vejo? Algum projeto? Nenhum.
Alguma ideia de desenvolvimento? Nenhuma. Nas três esferas, a dinâmica é
enfadonhamente a mesma: combater o inimigo público número um. Quem é? O
funcionário público.
Existem distorções e privilégios? Certamente. Só que as estratégias em
curso não parecem voltadas para combatê-los. Há alguma reforma avançando para
retirar benefícios imorais autoconcedidos como o auxílio-moradia da magistratura?
Não creio. O funcionário tornado alvo dos governantes sem projeto de
desenvolvimento é o da parte menos aquinhoada da tabela. O funcionalismo passou
a ser visto como corporação. Os políticos que defendem a eliminação dos
privilégios das corporações de funcionários públicos não abrem mão das suas
pencas de assessores inúteis nomeados pelos bons serviços na caça aos votos,
nem, em alguns casos, das suas aposentadorias especiais escandalosas.
O ideal dos políticos sem projeto não é a melhoria da vida de todos, mas
o achatamento das condições de aposentadoria da totalidade. Vamos combinar que
a aposentadoria pelos valores do INSS é miserável. Quando todos ganham menos, o
capitalismo agradece. Sobra mais para os donos do capital. O mundo já faz o que
o Brasil quer fazer? Existem países na contramão da história. A Suécia é um
deles. Capitalista e socialdemocrata, privilegia o interesse geral, não o ganho
de poucos. Esses políticos sem projeto andam fugindo dos debates. Querem falar
sozinhos. Sentem-se desconfortáveis no confronto de ideias. Podem ser
desmentidos quando esquecem de dizer que funcionários públicos não têm FGTS,
contribuem sobre a totalidade do salário e com alíquota maior.
O funcionalismo precisa fazer também a sua autocrítica. O interesse da
coletividade é fundamental. Só que essa ideia esconde um sofisma: trabalhar
para o contribuinte não significa ter de abrir mão de condições de labuta
adequadas e da conquista de direitos. O gestor hipermoderno vende uma ilusão:
se o Estado for mínimo, o custo será baixo e a satisfação será máxima. A falta
de imaginação seria compensada com a desmontagem do serviço público com base na
ficção de que a iniciativa privada faz tudo melhor e mais rápido. É preciso
combinar essa fórmula com os suecos e com outros países europeus. Esses caras
têm a mania de oferecer serviços públicos de qualidade.
Os gestores sem projeto nem imaginação sonham em alterar a regra do jogo
com o jogo terminando. Isso poderia ser aplicado aos seus mandatos. Não
satisfaz mais a sociedade, falhou, encurta. Só que não está regulamento. Uma
boa reforma das estruturas públicas poderia começar de maneira simples: nenhum
vereador terá mais de um assessor, nenhum deputado estadual terá mais de dois
assistentes, nenhum prefeito ou governador terá qualquer mordomia. Cada um
pagará diariamente até o cafezinho que tomar no seu gabinete. Água de graça.
Nada mais do que isso. E já bastante para que o fazem.
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