Ato político
O pensamento único viceja ainda, amplamente, na mídia. Qualquer problema – chove muito ou chove pouco – falta fazer as reformas neoliberais ainda pendentes.
O
nome que a atualidade do pensamento único tem hoje é o tal “custo Brasil”. A Ford não alegou, em nada, as tributações no Brasil.
Até foi para a Argentina, onde foi aprovado o imposto às
grandes fortunas. A direita de lá, como a de cá, sempre reclama do excesso de
impostos. Mas o imposto às grandes fortunas, apoiado por ampla maioria no
Congresso, da mesma forma que na Bolívia, tem um amplo apoio na sociedade
argentina.
Aqui,
qualquer tema econômico em discussão, ocupam a mídia os comentaristas dos
canais ou técnicos do mercado financeiro, diagnosticar de que a Ford vai embora
ou a economia não cresce, é devido ao
custo Brasil. O que querem dizer com isso? Que ainda não foram aprovados todos
projetos propostos por eles, na linha do Estado mínimo, do ajuste fiscal, das desregulamentações.
No
entanto, as reformas da previdência e laboral foram
aprovadas. Elas deveriam ir justamente na direção do barateamento dos cursos
dos investimentos. A maior parte dos trabalhadores já não tem carteira de trabalho, está relegado à situação de precariedade. O custo da
força de trabalho diminuiu drasticamente, às custas da perda de poder
aquisitivo dos trabalhadores, incluída a perda de tudo o que está incluído no
contrato de trabalho: férias, licença remunerada por gestão ou por acidentes, aposentadoria.
Em que essa diminuição do custo Brasil
ajudou a fazer com que a economia crescesse? Para onde foram os recursos
extraídos dos trabalhadores? Certamente não foram para os fundos de
investimento, porque não houve aumento dos investimentos, nem retomada do
crescimento da economia. Provavelmente foram para a especulação financeira, com
acumulação de riqueza, sem geração de empregos.
Neste caso, quem pagou o custo Brasil foram
os trabalhadores, sem que isto tenha revertido para eles, nem para o país.
Mas
talvez o custo Brasil seja outro, esteja em outro lugar. A intermediação
financeira é o custo mais alto que o país tem. No total, são 15% do PIB que
são canalizados para o capital financeiro, que encarece tudo o que se faz no
Brasil.
A especulação financeira tornou-se a
espinha dorsal da economia brasileira na era neoliberal. A atração da Bolsa de
Valores é muito maior do que os investimentos produtivos, porque a taxa de
juros é mais alta que a taxa de lucros, que vem dos investimentos produtivos. A
tributação na Bolsa é muito menor que em outros investimentos, além da liquidez
absoluta dos capitais na Bolsa.
Dessa
forma, os custos financeiros são o verdadeiro custo Brasil. Ao invés dos bancos serem um setor de apoio aos investimentos
produtivos, à pesquisa, ao consumo, eles funcionam a favor da acumulação
financeira, que não gera nem bens, nem empregos.
O
país todo, mas essencialmente os trabalhadores pagam o custo Brasil. Os custos
bancários recaem sobre o poder aquisitivo dos salários, sobre o endividamento
com os bancos, sobre os empréstimos. No neoliberalismo se dá assim uma
financeirização de toda a economia. Quem deve pagará mais; quem necessita não
toma dinheiro emprestado, pelo nível alto dos juros a pagar.
O
custo Brasil só deixará de existir, quando uma política econômica antineoliberal termine com o capital
financeiro como eixo da economia, para favorecer os investimentos produtivos, a
geração de empregos e a expansão do mercado interno de consumo de massas.
Emir Sader é um dos principais sociólogos e cientistas
políticos brasileiros
Publicado
originalmente no portal Brasil 247
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