Ato político
Que tempos são esses em que a razão perdeu a razão ou deixou de fazer sentido?
Penso o tempo inteiro
sobre a pandemia. Sou capaz de compreender razões diversas, inclusive as dos
que resistem a um lockdown. Nunca
entenderei, porém, com meus parcos recursos intelectuais, um ponto muito
específico: por que alguém rejeita o uso de máscara? Não me entra na cabeça. O
que é a máscara? Um pedaço de pano para proteger a boca e o nariz do vírus. Em
que pode esse pedaço de pano ser nocivo? Dificulta a respiração? Pode ser, mas
não a ponto de asfixiar uma pessoa. Estamos num combate inglório. Não existem
medicamentos que curem quem contraiu o vírus, a vacinação no Brasil é lenta,
dado que nos atrasamos na compra dos imunizantes e não investimos o suficiente
para desenvolver em tempo recorde, como a Índia fez, a nossa própria vacina,
que virá. A máscara é a proteção mais barata, eficaz e ao alcance da mão agora.
O
que pode levar alguém a ser contra a máscara? Irracionalismo, ignorância,
vontade de contrariar, bizarro cálculo político, negacionismo militante?
Digamos que a máscara possa dificultar a respiração se usada em tempo integral.
Acontece que não se fica de máscara 24 horas por dia. Crianças não precisam
estar constantemente mascaradas. Para quem quer menos restrições, por razões
econômicas, a máscara é o grande aliado. Na minha vã filosofia, não consigo
entender algumas coisas: como pode, no meio de uma pandemia devastadora, na
qual dois de cada três intubados morrem, alguém ficar sem máscara no meio de um
monte de gente numa praia? Que desespero é esse por praia? Consigo compreender
que seja muito difícil o isolamento para os mais pobres em moradias de um ou
dois cômodos com várias pessoas. Entendo as reclamações de empresários, ainda
mais os pequenos, com os efeitos da pandemia. Para mim eles devem ser amparados
pelo governo federal.
O que faz o cara andar
sem máscara na rua correndo, bufando, gritando, por vezes, na cara dos
passantes? A máscara deveria ser louvada. Uma tira de tecido, mais ou menos
sofisticada, de materiais diversos, apta a dar até uns 80 de proteção contra o
inimigo. Show! Aí o indivíduo recusa em nome das liberdades individuais e o
escambau. Por que usa cinto de segurança no carro? Por que anda vestido na rua?
A máscara protege quem usa e protege terceiros. A sociedade pode impô-la de
acordo com o “princípio de dano” teorizado pelo liberal John Stuart Mill, o
mecanismo que permite limitar a liberdade individual toda vez que ela possa
causar prejuízo a outros. A questão da máscara, contudo, é mais simples: bom
senso. Em Wuhan, onde tudo começou, a pandemia está controlada, não morre
ninguém desde abril de 2020, já não é obrigatório usar máscara, mas todo mundo
por precaução continua protegendo-se.
A máscara é um guarda-chuva. Faz sentido não usar guarda-chuva em nome
das liberdades individuais? Se quiser, não usa. Vai se encharcar. Só que, sem
máscara, o “rebelde” pode encharcar os outros. Nesta minha vida de retinas e
ouvidos tão saturados já me vi diante de muitos absurdos, talvez nenhum maior
do que a recusa da máscara de proteção contra o coronavírus. Cada coisa! Essa
talvez nem Freud explicasse.
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