Um pouco do brilhantismo de Marcos Rolim


Neste raiar de um novo ano, compartilho com vocês a crônica brilhante do sempre brilhante Marcos Rolim:


Presidente Janus
Marcos Rolim


Lula encerra seu governo com 87% de aprovação o quê, segundo o instituto Sensus, assinala recorde mundial. Nem Mandela obteve tal resultado. O fenômeno demanda uma análise criteriosa que, infelizmente, não será encontrada na maioria dos jornais. A propósito, os pesquisadores do futuro que tentarem compreender o que foram os dois mandatos de Lula a partir do que foi publicado pela mídia estarão diante de um mistério: como o presidente mais popular da história e o governo mais bem avaliado mereceram tão frequentemente o desprezo, a ironia e as críticas mais duras da imprensa? Ou, dito de outra forma, por que a mídia viu um governo e a ampla maioria da população viu outro?

A matéria é difícil e só autoriza hipóteses. Penso que a primeira diz respeito ao contraste com os governos anteriores. O presidente Fernando Henrique tem o mérito da estabilidade econômica – coisa que o PT, na época, não entendeu – mas, fora esta conquista, o que deixou como herança? FHC sempre foi paparicado pela mídia, mas a verdade é que ele endividou o Brasil de forma irresponsável, alienou patrimônio público em processo de “privataria”, mergulhou o ensino superior em sua mais grave crise e não realizou os investimentos mais importantes. Naquele tempo, as oposições exigiam do governo um salário mínimo de 100 dólares – sem sucesso, assinale-se-, o que diz o suficiente sobre os “compromissos sociais” da direita brasileira. Quando comparamos as conquistas do período Lula com os 8 anos de FHC, então, o contraste é tão grande que Lula se transforma em um gigante. E, antes de FHC, tivemos Itamar Franco, Collor e Sarney e, antes deles, a ditadura. Vamos combinar que o Brasil teve muita sorte de ter sobrevivido.

Seria preciso compreender, também, o alcance das políticas sociais de Lula. A mídia sempre tratou o “Bolsa Família”, por exemplo, com descaso considerando-o uma estratégia “eleitoral” destinada a criar dependência e preguiça. Enquanto os analistas se encantavam com seus preconceitos, entretanto, meio milhão de jovens pobres ingressava nas universidades e 15 milhões de brasileiros saíam da miséria; o que em um país excludente como o nosso assinala mudança radical. Não por acaso os aeroportos estão lotados, as lojas vendem como nunca e há carros em excesso. Os antigos pobres freqüentam espaços antes exclusivos e não falta quem se incomode, claro. A mídia, como regra, ficou com os incomodados.

O principal déficit do período Lula é a ausência de reformas institucionais. Neste ponto, nada andou. O PT, ao invés de reformar o modelo político, foi reformado por ele e o lulismo revelou, como na figura mitológica bifronte de Janus, sua face conservadora. As alianças com os setores fisiológicos do Congresso e a convivência, cada vez mais cordial, com a corrupção são os símbolos de um passado que se mantém presente no lulismo. As duas cabeças de Janus representavam os términos e os começos, o passado e o futuro. Por isso, Janus abria as portas para o ano novo. Que os deuses auxiliem a presidente Dilma, então, a dar término ao término, inaugurando um novo começo ao cruzar a porta aberta por Lula.

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