Catando estórias
A semente da mostarda
Krisha Gotami teve um
filho e este morreu. Transida de dor, ia com o filho morto de casa em casa,
pedindo um remédio, e as pessoas diziam:
-Está doida: a criança
está morta.
Finalmente, Krisha Gotami
encontrou um camponês que respondeu sua súplica dizendo:
-Não posso dar um remédio
para a criança, porém sei de um médico capaz de o dar.
E Krisha Gotami
respondeu:
-Suplico-te que me digas
quem é.
-Vai ver o Buda.
Krisha Gotami foi ver o
Iluminado e exclamou, chorando:
-Senhor meu e mestre. Meu
filho estava brincando entre as flores e tropeçou numa serpente que se enroscou
no seu braço. Ficou logo pálido e silencioso. Não posso aceitar que ele deixe
de brincar ou que deixe o meu colo. Senhor meu mestre, dá-me um remédio que
cure o meu filho.
O Iluminado respondeu:
-Sim irmãzinha, há uma
coisa que pode curar teu filho e a ti, se puderes consegui-la, porque os que
consultam os médicos tomam o que lhes é receitado.
Procura uma simples
semente de mostarda preta, porém só deves receber de uma casa onde nunca tenha
entrado a morte, onde não tenha ainda morrido pai, mãe, filho nem filha, nem
irmão, nem irmã, nem escravo nem parente.
Aflita, Krisha Gotami foi
de casa em casa pedindo o grão de mostarda. As pessoas se compadeciam dela e
lhe davam, porém, quando ela pergunta se já tinha morrido alguém naquela casa,
lhe respondiam:
-Ah! Poucos são os vivos
e muitos os mortos. Não despertes nossa dor.
Agradecida, ela lhes
devolvia a mostarda e dirigia-se a outros que lhes diziam:
-Aqui está a semente,
porém já morreu nosso escravo.
-Aqui está a semente,
porém o semeador morreu entre a estação chuvosa e a colheita.
E não encontrou nenhuma
casa onde não tivesse morrido alguém.
Krisha Gotami voltou
chorosa para o Iluminado dizendo-lhe:
-Ah! Senhor, não pude
encontrar mostarda em casa onde não tivesse havido morte. Então, entre as
flores silvestres, na margem do rio, deixei meu filho que não queria mamar nem
sorrir, e volto para ver teu rosto e beijar teus pés suplicando-te que me digas
onde encontrar essa semente, sem deparar ao mesmo tempo com a morte, pois,
apesar de tudo não posso crer na morte de meu filho, como todos me disseram e
temo tenha acontecido.
O mestre respondeu-lhe:
-Minha irmã, procurando o
que não podes encontrar, achaste o amargo bálsamo que eu queria dar-te. Sobre
teu seio, o ser que amas dormiu hoje o sono da morte. Agora já sabes que todo
mundo chora uma dor semelhante à tua. O sofrimento que aflige todos os corações
pesa menos do que se concentrado num só. Escuta! Derramaria eu meu sangue se,
derramá-lo pudesse deter tuas lágrimas e descobrir o segredo de o amor causar
angústia e através de prados floridos conduzir-vos ao sacrifício, qual mudos
animais conduzidos por seus donos. Nenhum nascido pode evitar a morte. Assim
como os frutos maduros caem da árvore, assim os mortais estão expostos à morte
desde que nascem. A vida corporal do homem acaba partindo-se como a vasilha de
barro do oleiro. Jovens e adultos, néscios e sábios, todos estão sujeitos à
morte. Porém, o sábio que conhece a Lei não se perturba, porque nem pelo pranto
nem pelo desânimo obtém a paz, mas pelo contrário, isso tudo aviva as dores e
os sofrimentos do corpo. A morte não faz caso de lamentações. Morre o homem, e
seu destino está determinado por suas ações. Embora viva dez ou cem anos, acaba
o homem por separar-se de seus parentes ao sair deste mundo. Quem deseja a paz
da alma, deve arrancar de sua ferida a flecha do desgosto, da queixa, da
lamentação. Feliz será aquele que consegue vencer a dor. Sepulta tu mesma o teu
filho.
Extenuada pela dor,
Krisha Gotami sentou-se à beira do caminho, pôs-se a meditar no silêncio do
entardecer e disse consigo: "Quão egoísta sou eu em minha dor! A morte é o
destino comum de tudo quando vive. Porém, neste vale desolado há um caminho que
conduz à imortalidade - aquele que elimina de si todo egoísmo.
E sufocando o amor
egoísta que sofria por seu filho, enterrou-o no bosque. E foi logo refugiar-se
no Iluminado, e encontrou consolo que alivia o coração dilacerado pela dor.
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