Ato político
Durante a
última campanha eleitoral, Tarso Genro disse reiteradas vezes que a questão não
era se existia ou não uma crise no RS, e sim como enfrentar tal crise. Além disso, quem não sofre do mal da memória curta, deve lembrar que antes de Tarso chegar
ao governo, a RBS promoveu ou levou ao ar várias reportagens, comentários, programas e debates acerca da crise
estrutural histórica que atingia nosso estado, a qual de acordo com figuras
como Lasier Martins, existia há cerca de 40 anos.
Passados
alguns meses do novo velho governo do PMDB no RS, desta feita comandado por
Sartori, já deu para perceber o quanto Tarso foi franco e acertou na mosca. Bastou
mudar o governo para a forma de enfrentar os desafios e demandas do estado
mudar radicalmente e para pior, afinal agora aqueles que mais precisam da ação
do governo e das políticas públicas são justamente os que mais pagam o pato.
Se antes os
servidores, especialmente o magistério, brigavam pelo piso (sem considerar os enormes
aumentos dados pelo governo e que da forma que fora instituído o piso do
magistério era impagável para qualquer governo em qualquer parte do mundo),
agora a briga é pura e simplesmente receber em dia durante os próximos quatro
anos, uma vez que a LDO aprovada pela base governista na AL fecha a porta para
qualquer aumento.
Durante o
governo Tarso ninguém ouviu falar em fechamento de hospitais ou no caos da
saúde. Mesmo com a crise estrutural do estado, Tarso depois de muitos anos
cumpriu a determinação constitucional de investir 12% do orçamento estadual nesse
setor vital, salvou muitos hospitais do fechamento, aumentou a oferta de
serviços do SUS e foi um parceiro importante dos municípios em políticas de
saúde. Só em Herval tal parceria assegurou a compra de três ambulâncias, três
veículos doblôs, uma van para o transporte de pacientes, o funcionamento do
raio x no hospital, além do convênio inédito que vinha injetando importantes
recursos no hospital da nossa cidade. Bastou Sartori assumir para tudo ir pelo
ralo e a saúde voltar para a UTI.
Poderia falar
ainda de um monte de outras iniciativas sob o comando de Tarso, o PT e os partidos
da Unidade Popular Pelo Rio Grande que demonstram que o RS estava em boas mãos
e no rumo certo, mas esse não é o foco nem o propósito desse escrito.
Meu foco e
propósito aqui e agora é dizer que assino embaixo das palavras de Tarso acerca
do Papa Francisco. Muito além da retórica, Francisco vem anunciando uma imensa
luz nesse túnel escuro e sem fim que a sede desenfreada do lucro a custa dos
mais pobres vem alcançando a nível global. Ainda falando em foco, a resposta
das grandes corporações de comunicação aos ditos e feitos lúcidos do Papa tem
sido o mais absoluto silêncio, comportamento idêntico ao dispensado ao governo
do estado na gestão passada, quando atos e conquistas importantes eram
solenemente ignoradas pela grande imprensa e, assim, passavam batidas aos olhos
e ouvidos do público que não costuma se alimentar de outras fontes de
informação e notícias.
Aliás, convém falar em outra artimanha da mega mídia, uma vez que diante dos ajustes pelos quais passa o país as todo poderosas e monopolistas empresas de comunicação brasileiras, como de costume, adotam posição tendenciosa e perversa. Falam como se a crise fosse algo exclusivo do Brasil, e não um fenômeno de proporções globais. Falam que as medidas adotadas para enfrentar a crise são amargas ou mera maldade do governo, mas não falam que se a oposição tivesse vencido a eleição as doses do remédio dito amargo seriam cavalares e o tratamento seria por tempo indeterminado, e não apenas temporário como se espera com o atual governo.
Aliás, convém falar em outra artimanha da mega mídia, uma vez que diante dos ajustes pelos quais passa o país as todo poderosas e monopolistas empresas de comunicação brasileiras, como de costume, adotam posição tendenciosa e perversa. Falam como se a crise fosse algo exclusivo do Brasil, e não um fenômeno de proporções globais. Falam que as medidas adotadas para enfrentar a crise são amargas ou mera maldade do governo, mas não falam que se a oposição tivesse vencido a eleição as doses do remédio dito amargo seriam cavalares e o tratamento seria por tempo indeterminado, e não apenas temporário como se espera com o atual governo.
Além disso, alardeiam que o Brasil está no fundo do
poço, mas além de negar que as medidas mais radicais contra a crise são
passageiras, também escondem que na
comparação com outros países, o quadro no Brasil (na Espanha, por exemplo, o
desemprego supera os 20%) está longe de ser desolador ou caótico. Se formos deixar a
propaganda global ou golpista de lado e atentarmos para a vida real, veremos
que o Brasil passa sim por uma turbulência provocada pela crise mundial (até
porque não somos uma ilha), porém que já passamos por crises muitos piores no passado (inclusive, durante o governo dos tucanos) e que a coalizão que
governa o país já provou, assim como o Papa Francisco, que tem capacidade e compromisso com
os mais pobres (tanto que esse é o principal motivo da crítica dos adversários) e segue merecendo a confiança das pessoas de
boa-fé e dos brasileiros e brasileiras que nunca desistem de fato do Brasil.
Não
“habemus” mais Papa?
Por Tarso Genro
Vamos imaginar uma situação
diferente da que aconteceu na semana passada, na qual o Papa asseverou que o
capitalismo é uma “ditadura sutil”, que a concentração monopolista dos
meios de comunicação impõe “pautas alienantes” e gera um “colonialismo
ideológico”, e supor o que ocorreria se o Papa defendesse a redução das funções
públicas do Estado, o direito a monopolizar a formação da opinião, o mercado
desregulado e o império cultural dos países ricos sobre os países pobres.
Convém notar, em primeiro lugar, que as importantes manifestações do Papa
tiveram escassos reflexos nas pautas nobres da grande mídia, com exceção da
Folha de São Paulo, e só foram expandidas, como informação,
pelas “redes” alternativas de comunicação.
Creio que se o Papa tivesse
defendido as posições já conhecidas do liberalismo de direita, teríamos o
início de uma nova grande campanha contra o setor público, contra os
pressupostos de um Estado Social de Direito e, certamente, um novo ciclo de
propaganda dos “ajustes”, que tem massacrado as camadas sociais mais
pobres de todos os continentes. Se o Papa tivesse adotado as posições já
conhecidas da direita liberal, teríamos um novo ciclo de lavagem
cerebral, de natureza ideológica, baseada num velho princípio que informou as
saídas de crises, sob governos comprometidos com os mais ricos: na hora
de bonança e crescimento concentremos renda, na hora de perdas e recessão
distribuímos os prejuízos para baixo.
Parece que todos aqueles
colunistas, jornalistas, “especialistas” de plantão da grande mídia, que
saudaram a emergência de um Papa que se locomovia de ônibus, que conhecia a
vida dos pobres de Buenos Aires, que falava com palavras simples aos seus
fiéis, não esperavam que ele fosse o homem que aparentava ser: um homem
profundamente religioso, que não escondia as suas convicções de que o ser
humano real, este que sofre os tormentos do capitalismo “sem alma”,
merece a atenção e o carinho de uma Igreja que promete a salvação na
eternidade.
Nas memórias do grande diretor
John Huston está transcrita uma carta do magnífico escritor B.Traven, autor do
precioso, entre outros, “Tesouro de Sierra Madre”, que se
tornou película dirigida por Huston e cujo personagem principal
foi encenado por Humphrey Bogart. O escritor, que duvidava da seriedade de
intenções dos que queriam transformar seu livro em filme diz, na carta citada
por Huston: “Em Hollyhood todo mundo pensa unicamente em dinheiro e em
novos contratos, ninguém pensa em fazer algo extraordinariamente grande.”
Fazer “algo
extraordinariamente grande”, mesmo se os tortuosos caminhos da História venham,
depois -independentemente da vontade daqueles seres humanos
especiais- desviar o curso da sua intencionalidade ética. O Papa deve ter
pensado algo parecido, quando deu as declarações que afrontaram aqueles
que, além de deter um poder extraordinário pela sua riqueza material, controlam
a formação das opiniões a seu respeito. E o fazem porque subjugam o
“direito humano à comunicação”, como diz aqui o nosso professor Pedrinho
Guareschi, colocando as emoções a serviço da acumulação sem trabalho e
profanando os corpos na chama irracional do consumismo.
A Europa das Luzes
teve capacidade de combinar, por um certo tempo, a emergência da cultura
democrática com o escravismo; depois, fez conviver a democracia política com o
colonialismo e seus massacres; hoje, depois do curto reinado
social-democrata -na mesma Europa- a
Alemanha, nação devedora do Século passado que jamais pagou suas
dívidas de guerra, dá um passo trágico: faz da Grécia, estuprada
pelo nazismo, a Câmara de tortura do capital financeiro. Nós, seres não
especiais, dizermos isso que o Papa disse, é o trivial. O não-trivial é o
Papa dizer isso, que ele disse, e a grande mídia praticamente censurar suas
mensagens.
Parece que, de repente, o essencial
do que é o Papa, um ser humano solidário com os pobres e que desafia o
capitalismo a ser verdadeiramente democrático, que não teme ser taxado
de “esquerda” -parece que este Papa essencial- deixou de existir
para a grande mídia, que o tratará, agora, como já fez um apressado colunista
da mesma Folha, como um populista-peronista. O Papa, que não teve seu coração
nem sua mente forjados pela direita midiática escapou do controle ideológico do
neoliberalismo, e disse: sois seres humanos, não sois mercadorias. Não aceitem
isso que aí está, façam algo extraordinariamente grande!
.oOo.
Tarso Genro foi governador do Estado do Rio Grande
do Sul, prefeito de Porto Alegre, Ministro da Justiça, Ministro da Educação e
Ministro das Relações Institucionais do Brasil.
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