Ato político
“Ato político” trás Marcos
Coimbra em linhas retas, implacáveis e sóbrias...
A herança de Fernando Henrique,
por Marcos Coimbra
A avaliação de seus mandatos captada em
pesquisas explica o motivo de Alckmin e Serra não terem defendido o seu legado.
O que fará Aécio Neves?
Enquanto não surgir coisa mais
avançada, as pesquisas de opinião continuarão a ser a melhor maneira de
interpretar o pensamento da população a respeito das questões coletivas. Sem
elas, ficamos com o que acha cada indivíduo ou dizem os grupos mais organizados
e loquazes. Os sentimentos e atitudes da maioria permanecem ignorados. É como
se não existissem.
Mas as pesquisas estão aí. E permitem
uma compreensão dos juízos e as expectativas dos que não se expressam, não
mandam cartas ou postam comentários na internet. Há outras formas de fazê-lo,
mas nenhuma mais confiável.
Realizá-las não é extravagância ou
privilégio. Não custam tanto e um partido político poderoso, como, por exemplo,
o PSDB, pode encomendar as suas. Nem um jornal ficará pobre se tiver de contratar
alguma.
Por que então as oposições brasileiras
as usam tão parcimoniosamente? Por que, se é simples conhecê-la, os partidos e
a mídia oposicionista desconsideram a opinião pública? Tome-se uma velha
ideia: as três derrotas sucessivas dos tucanos para o PT teriam sido causadas
pela insuficiente defesa da “herança de Fernando Henrique”. Sabe-se lá por que,
é uma hipótese que volta e meia reaparece, como se fosse uma espécie de verdade
profunda e houvesse evidências a sustentá-la.
Nas últimas semanas, ela retornou ao
primeiríssimo plano. Em seu discurso inaugural como presidente nacional do
PSDB, o senador mineiro Aécio Neves disse que seu partido se equivocou ao não
valorizar o “legado” das duas administrações de FHC. Em suas palavras: “Erramos
por não ter defendido, juntos, todo o partido, com vigor e convicção, a grande
obra realizada pelo PSDB”.
Salvo uma ou outra manifestação de
cautela, a mídia conservadora aplaudiu o pronunciamento. Os “grandes jornais”
gostaram de Aécio ter assumido uma tese com a qual sempre concordaram.
Faltava-lhes um paladino e o mineiro ofereceu-se para o posto.
E os cidadãos comuns, o que pensam
desse “legado”?
Em pesquisa recente de âmbito nacional,
o Vox Populi tratou do assunto. Em vez de subscrever (ou atacar) a tese, apenas
identificou o que a população pensa a respeito.
Os entrevistados foram solicitados a
avaliar 15 áreas de atuação do governo Dilma Rousseff. Depois, a comparar o
desempenho de cada uma nos governos dela e de Lula com o que apresentavam
quando Fernando Henrique Cardoso era presidente. As avaliações de todas as
políticas nos governos petistas são superiores. Em nenhuma se poderia dizer
que, para a população, as coisas estavam melhores no período tucano.
Consideremos algumas: na geração de
empregos, 7% dos entrevistados disseram que FHC atuou melhor, enquanto 75%
responderam que Lula e Dilma o superaram. Na habitação, 3% para FHC e 75% para
Lula e Dilma. Nos programas para erradicar a pobreza, 4% ficaram com FHC e 73%
com os petistas. Na educação, o tucano foi defendido por 5% e os petistas por
63%. Na política econômica, em geral, FHC foi avaliado como melhor por 8%,
enquanto Lula e Dilma, por 71% dos entrevistados.
No controle da inflação, FHC teve seu
melhor resultado: para 10%, ele saiu-se melhor que os sucessores, mas 65%
preferiram a atuação de Lula e Dilma no controle de preços.
Na saúde e na segurança, os petistas
tiveram as menores taxas de aprovação, mas mantiveram-se bem à frente do
tucano: na primeira, Lula e Dilma foram considerados melhores por 46% dos
entrevistados. Na segurança, por 45%. FHC, por sua vez, por 7% e 6%.
No combate à corrupção, FHC teria
atuado melhor que seus sucessores para 8%, enquanto 48% dos entrevistados
afirmaram ter Lula e Dilma sido superiores.
Os políticos e as empresas jornalísticas
são livres para crer no que quiserem. Enéas Carneiro era a favor da bomba
atômica. Levy Fidelix é obcecado pela ideia de espalhar aerotrens pelo Brasil.
Os partidos de extrema-esquerda lutam pelo comunismo. Há quem queira recriar a
velha Arena da ditadura.
Ancorar uma campanha presidencial na
“defesa do legado de FHC” é um suicídio político. Nem Serra nem Alckmin
quiseram praticá-lo. A derrota de ambos nada tem a ver com o fato de não terem
feito tal defesa. O problema nunca foi estar distantes demais dos anos FHC, mas
de menos.
Resta ver como se comportará, na
prática, Aécio Neves. E o que dirão seus apoiadores, quando perceberam que
também ele procurará fazer o possível para se afastar do tal “legado”.
Comentários